A INTERPRETAÇÃO DOS CONTRATOS SOB A ÓTICA DA VERTENTE DO DUTY TO MITIGATE THE LOSS

Natália Camargo Grillo SILVA

Resumo


Interpretar um contrato significa elucidar qual o sentido das declarações de vontades das partes e determinar o significado do acordo formalizado no contrato. Mais do que isso, significa aclarar qual os efeitos jurídicos projetados pelos envolvidos neste acordo. O intérprete, portanto, possui como função tradicional determinar com precisão a efetiva vontade das partes e quais os efeitos jurídicos almejados na esfera jurídica, seja de ordem patrimonial ou não. O legislador o ajuda à medida em que dita preceitos interpretativos, um deles de cunho objetivo, trata do princípio da boa-fé objetiva (ORLANDO, 2007, p. 245). O princípio da boa-fé objetiva apresenta enquanto uma de suas vertentes o dever de as partes colaborarem para mitigar ou evitar o agravamento de seus próprios prejuízos na execução dos contratos (duty to mitigate the loss) (FRADERA, 2004, p. 109-119). Trata-se de importante instituto jurídico nas relações contratuais e serve como indicador no momento em que o intérprete necessita analisar e interpretar contratos que estejam sofrendo alterações em decorrência de eventos não previstos pelas partes. A título de exemplo, a crise da Covid-19 trouxe uma revisão forçada das relações negociais privadas na medida em que ocasionou uma série de impactos na vida financeira e econômica de pessoas físicas e jurídicas. São inúmeros os setores e tipos de contratos potencialmente afetados pela atual crise, a exemplo dos contratos bancários, de aluguel, de empreitada, de fornecimento, financeiros e derivativos em geral. Desta conjuntura, emergem problemas a serem solucionados pelo direito privado quanto ao inadimplemento dos contratos celebrados antes do cenário de crise, tanto nos de longa duração, ou de execução continuada, em que as prestações devem ser cumpridas durante a crise, quanto nos de adimplemento futuro. Neste contexto, ganha especial relevância a aplicação do princípio da boa-fé objetiva em sua acepção colaborativa do dever de mitigar as próprias perdas, já que pode servir como um excelente regulador para interpretar os contratos de ordem privada. Com efeito, portanto, a hipótese que se aparenta crível, enquanto resposta provisória ao questionamento levantado, é que a aplicação do princípio da boa-fé objetiva (artigo 422 do Código Civil), na acepção colaborativa do duty to mitigate the loss, somado ao dever de o magistrado considerar as consequências práticas de sua decisão na adoção deste princípio (artigo 20 da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro) são mecanismos que podem ser úteis e/ou essenciais para amenizar os prejuízos sofridos por todos os envolvidos nas relações negociais.  A elaboração do trabalho adotou o método hipotético-dedutivo e tem suporte em revisão de literatura da doutrina civilista especialmente aquelas que tratam sobre boa-fé objetiva, sua caracterização, alcance normativo e desdobramentos, como Orlando Gomes, Flávio Tartuce e Vera Jacob Fradera.


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