DA ZONA FRONTEIRIÇA ENTRE BOA-FÉ E DOLO EVENTUAL

Paulo Augusto da SILVA

Resumo


Notadamente é desafiadora a análise de zona fronteiriça entre o direito civil e o direito penal, mais especificamente entre a boa-fé, seu antônimo lógico, a má-fé, e o dolo eventual. É certo que o direito penal sendo a ultima ratio, no mais das vezes, uma situação de fato, inicia-se numa relação cotidiana, relação obrigacional de compra e venda, p. ex., e em dado momento ela transcende o alcance da seara cível e adentra na seara penal, ensejando tal responsabilidade. Há linha ainda mais tênue no caso de estelionato, quando o autor se vale de uma relação de compra e venda de veículo, v.g., e usa o dono do veículo como meio para auferir vantagem indevida do comprador de boa-fé. O autor visualiza um anúncio da venda de um veículo e entra em contato remoto com o proprietário. Se mostra interessado e diz que vai comprar o veículo, mas que terceira pessoa irá busca-lo. Que essa pessoa lhe deve um dinheiro, e por isso, o vendedor não deve falar de valores com o comprador. De outro lado, o agente entra em contato com o comprador e diz que é parente do vendedor, e que este tem uma dívida consigo, e por isso, não deve falar sobre valores. Que o comprador pode ir até a casa do vendedor e buscar o veículo, mas que deverá fazer a transferência do valor para a conta que ele indicar. Assim, para o comprador, o agente oferece um valor menor que o anunciado, e dessa forma, o comprador fica entusiasmado com o pretenso negócio jurídico. De outro lado, o vendedor se mostra satisfeito por ter conseguido um comprador para seu veículo de maneira célere, conseguindo assim efetivar o seu intento com a venda de seu bem. Ao final, o comprador transfere o dinheiro para o agente e fica sem ele e sem o veículo. O vendedor, fica sem o conseguir efetivar seu negócio, e no mais das vezes, acaba que por ser inadimplente na relação obrigacional, pois o comprador, é terceiro de boa-fé. Assim o é, pois, o agente estelionatário, inventa uma história para levar o comprador a erro, e no mais das vezes, o vendedor, influenciado pelo agente, corrobora com a versão narrada, trazendo um incremento na consumação delitiva e no prejuízo do terceiro de boa-fé. Não são raros os casos em que o vendedor aponta ao comprador a conta corrente do agente para que os valores sejam depositados. Nesse jaez, o vendedor queria apenas vender seu veículo, mas é usado como meio para fim de cometimento de delito. Ele não tem dolo de estelionato, mas não está totalmente de boa-fé, pois incrementa e contribui para a consumação delitiva.

Palavras-chave


Dolo eventual. Má-fé. Boa-fé. Compra e venda.

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