CULPABILIZAÇÃO DA VÍTIMA NO CRIME DE ESTUPRO

Maria Clara Sgarbi Stersi dos SANTOS, José Artur Teixeira GONÇALVES

Resumo


Os crimes contra a dignidade sexual, com destaque para o crime de estupro, são formas de violência constantes nas mais diversas sociedades, desde a antiguidade, quando o crime de estupro era considerado delito contra a propriedade, até os dias atuais, em que é considerado crime contra a dignidade humana. No período colonial, na América portuguesa, o crime era confundido com pecado e com ofensa moral e tinha penas severas. No Código do Império, era considerado estupro a conjunção carnal contra mulher “virgem e honesta”. A partir desse código, no entanto, as prostitutas poderiam sofrer estupro, mas o réu tinha uma pena mais branda conforme a “honestidade” da mulher. Em 1890, com o Código Criminal da República, os “delitos de atentado violento ao pudor e estupro” passam a ser classificados sob o título de “violência carnal”, no âmbito de proteção da “segurança da honra, honestidade das famílias, e do ultraje público ao pudor”. Em 1940, inaugurou-se o ainda vigente Código Penal, que sofreu, ao longo dos anos, muitas mudanças em relação a este crime. Uma dessas mudanças veio com a Lei 8.930/90, incluindo o estupro como crime hediondo. No entanto, a mudança mais considerável ocorreu com advento da Lei 12.015/09, que unificou os artigos 213 e 214 do Código Penal, pois até 2009 o estupro era considerado um crime contra os costumes. Além disso, entendia-se que só a mulher era passível de sofrer o estupro e este crime estava restrito à conjunção carnal. Desde a Lei 12.015/09, o conceito evoluiu e o estupro englobou não apenas a mulher, mas igualmente o homem e abrangeu não meramente a conjunção carnal, mas qualquer ato libidinoso. Apesar da mudança legislativa, o estereótipo que atenta contra a dignidade sexual da mulher ainda continua enraizado na sociedade. Nesse trabalho será analisado o crime de estupro pela ótica de gênero. Devido à dissimetria de gênero, muitas vezes a mulher é responsabilizada como motivadora do crime. A questão probatória nestes tipos de delitos é sempre tenebrosa. A palavra da vítima tem muito peso, no entanto quando esta é mulher e maior de 18 anos, as provas materiais são necessárias, assim como perícia é muito importante, devido ao “descrédito” quanto à palavra da vítima. Colocar a mulher como responsável pelo delito se dá muitas vezes em razão das vestimentas, comportamentos sociais, sua vida sexual, como se houvesse um estereótipo para se comportar e evitar o estupro. No presente trabalho será analisado “caso in concretu” e dados de pesquisas recentes sobre o assunto tratado. Em dados já apurados verificou-se que a maioria dos estupros em mulheres adultas são praticados por conhecidos se aproveitando de situações como festas. Estas também sofrem violência por parte de seus parceiros, desmitificando aquela ideia de que a violência vem sempre do estranho.

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